segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Percalço matinal



Os passageiros matinais que ascendem da plataforma dos trens do Metrô para o grande salão de saída da estação Sé deparam-se com um senhor de uns setenta e poucos anos sentado no chão, junto a um dos largos pilares circulares que sustentam a praça acima. Pernas paralelas e retas, tronco ereto a noventa graus, calça jeans, casaco, tênis em bom estado, cabelos brancos aparados, barbeado, não parece ser um daqueles sem-teto que perambulam pela Praça da Sé. Seu olhar perdido, de procura e espera, que vaga pelos passantes, vendo sem enxergá-los, mostra que algo não está bem. Passaria mal, perguntam-se os usuários metroviários caminhando rápido em direção às catracas de saída, sem tempo de acudir o senhor ali estatelado.

No meio da manada apressada, desgarra-se um bom samaritano, que abandona a trilha para ajudar o idoso homem. Ele caminha direto em direção ao velho, vai ajudá-lo ou pedirá ajuda para ele, a sapataria pode esperar um pouco. Os dois se olham, ambos querendo adivinhar o que se passa com o outro. No meio do caminho, os olhares são trocados: a curiosidade some, os olhos do homem sentado mostram medo, os do que caminha, surpresa. Um teme pela perda do seu bem mais precioso, do qual depende para viver, ligar-se ao mundo, exercer sua cidadania. O outro sorri quando descobre, oculto pelas pernas cansadas, um singelo celular sendo carregado numa tomada engastada no robusto pilar, qual uma mãe amamentando seu bebê.....


José FRID

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