quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Na escuridão...

[...] Uma noite despertei no silêncio escuro do meu quarto e vi, na parede revestida com papel de flores violeta,uma luz. Desde o primeiro instante tive a ideia de que algo extraordinário estava acontecendo comigo e não me assustei. Movi os olhos para um lado e a mancha de luz seguiu o mesmo movimento. Era uma mancha parecida à que  se vê no escuro quando se apaga uma lamparina; mas se mantinha por bastante tempo e era possível ver através dela. Baixei os olhos até a mesa e vi as garrafas e meus objetos. Não me restava a menor dúvida; aquela luz saía de meus próprios olhos e vinha se desenvolvendo desde muito tempo. Passei o dorso da mão diante do rosto e vi meus dedos abertos. Logo senti cansaço; a luz diminuía, e fechei os olhos. Depois tornei a abri-los para comprovar se aquilo era certo. Olhei a lâmpada elétrica e vi que ela brilhava com a minha luz. Voltei a me convencer e dei um sorriso. Quem, no mundo, via apenas com os próprios olhos na escuridão?
  
Felisberto Hernández in O lanterninha, tradução de Davi Arrigucci Jr, Os Melhores Contos da América Latina, organização de Flávio Moreira da Costa, Agir Editora,  pág.323

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