domingo, 13 de maio de 2012
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sexta-feira, 11 de maio de 2012
Mancha
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terça-feira, 11 de outubro de 2011
A Casa é Sua
Não me falta cadeira
Não me falta sofá
Só falta você sentada na sala
Só falta você estar
Não me falta parede
E nela uma porta pra você entrar
Não me falta tapete
Só falta o seu pé descalço pra pisar
Não me falta cama
Só falta você deitar
Não me falta o sol da manhã
Só falta você acordar
Pras janelas se abrirem pra mim
E o vento brincar no quintal
Embalando as flores do jardim
Balançando as cores no varal
A casa é sua
Por que não chega agora?
Até o teto tá de ponta-cabeça
Porque você demora
A casa é sua
Por que não chega logo?
Nem o prego aguenta mais
O peso desse relógio
Não me falta banheiro, quarto
Abajur, sala de jantar
Não me falta cozinha
Só falta a campainha tocar
Não me falta cachorro
Uivando só porque você não está
Parece até que está pedindo socorro
Como tudo aqui nesse lugar
Não me falta casa
Só falta ela ser um lar
Não me falta o tempo que passa
Só não dá mais para tanto esperar
Para os pássaros voltarem a cantar
E a nuvem desenhar um coração flechado
Para o chão voltar a se deitar
E a chuva batucar no telhado
A casa é sua
Por que não chega agora?
Até o teto tá de ponta-cabeça
Porque você demora
A casa é sua
Por que não chega logo?
Nem o prego aguenta mais
O peso desse relógio
Arnaldo Antunes
terça-feira, 3 de maio de 2011
Socorro
Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar, nem pra rir
Socorro, alguma alma, mesmo que penada
Me entregue suas penas
Já não sinto amor, nem dor, já não sinto nada
Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate, nem apanha
Por favor, uma emoção pequena
Qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Em tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Socorro, alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento, acostamento, encruzilhada
Socorro, eu já não sinto nada, nada
Arnaldo Antunes e Alice Ruiz
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
CULTURA
O girino é o peixinho do sapo.
O silêncio é o começo do papo.
O bigode é a antena do gato.
O cavalo é o pasto do carrapato.
O cabrito é o cordeiro da cabra.
O pescoço é a barriga da cobra.
O leitão é um porquinho mais novo.
A galinha é um pouquinho do ovo.
O desejo é o começo do corpo.
Engordar é tarefa do porco.
A cegonha é a girafa do ganso.
O cachorro é um lobo mais manso.
O escuro é a metade da zebra.
As raízes são as veias da seiva.
O camelo é um cavalo sem sede.
Tartaruga por dentro é parede.
O potrinho é o bezerro da égua.
A batalha é o começo da trégua.
Papagaio é um dragão miniatura.
Bactéria num meio é cultura.
Arnaldo Antunes in O Globo, 26/07/2009 via Caquis Caídos de Adriana Lisboa
domingo, 31 de janeiro de 2010
CHACINA
Acertaram aquele e o amigo dele
O de blusa listrada com a namorada
O menor correu, seu irmão morreu
O seu pai sumiu, nunca mais se viu
O de short azul, pasto de urubu
Camisa vermelha sobre o peito nu
Dois estão feridos mais sete escondidos
E os outros seis já viraram três
Quem tava do lado também foi queimado
Quem pode escapar não pode falar
Ninguém teve pena, ninguém teve dó
Daquela família só ficou a avó
E daquele corpo, osso dente e unha
Ninguém quer o troco, ninguém testemunha
Não deu na TV, nem deu no jornal
Não foi pra cadeia, nem pro hospital
Não teve caixão, não teve funeral
E TEM MUITA GENTE QUE ACHA NORMAL
Poema de Arnaldo Antunes. Música de Edvaldo Santana. Gravado no CD Reserva de Alegria.