terça-feira, 16 de outubro de 2007

Em Paris, mas podia ser em São Paulo ou no Rio

La Liberté

por Chéri direto de Paris

http://cheriaparis.blogspot.com

"Outro dia passei no La Liberté pra tomar uma cerveja depois de um show.

O La Liberté é talvez o bar de Paris que mais parece os famosos "pés sujos" brasileiros. Com a diferença de que não é sujo. Bem, não muito. Mas todo o resto está lá: cerveja barata, portas abertas até mais tarde, ótima música e, o principal, uma fauna de freqüentadores das mais esquisitas. Tudo o que faz um bom boteco.

Depois de uma certa luta, consegui chegar ao balcão.

- Um chope, por favor.
- Voilà.


Pedi, paguei e bebia tranqüilamente. Já estava no finzinho quando um loiro semi-gigante, meio vesgo de tanta birita, aproximou-se, pegou minha tulipa e virou o resto de uma vez só, provavelmente pensando que era dele. Ou talvez nem pensando mais. Achei que devia reclamar, mas o cidadão era tão grande que a minha voz demoraria uns 2 minutos para chegar lá em cima. A comunicação partiu dele.

- E aí, o que você está festejando hoje?
- Nada.
- Eu também não.


Com a boca mais mole do que gelatina e um olho em mim e outro no teto, disse isso, pegou um chope e brindou com meu copo vazio.

- Ao nada.
- Ao nada.


E saiu tropeçando para o outro lado do bar.

Continuei ali pelo balcão. O balcão é sempre onde você escuta as melhores histórias. E um cliente reclamava com um dos donos.

- Mas eu não bebi nada na 4a feira.
- Não interessa. Se você levanta o dedo e pede uma cerveja, eu presumo que seja pra você e coloco na sua conta.
- Sim, eu levantei o dedo, mas não bebi. Era pro meu amigo.
- Então não levante mais o dedo pedindo.


O balconista disse isso e foi atender outra pessoa. Quando virou-se novamente, o mesmo carinha que reclamava estava com o dedo em riste.

- Uma cerveja.


Nesse meio tempo, a música muda. E Aretha Franklin sai das caixas de som. O sujeito que pediu a bebida deixa o balcão antes de recebê-la, começa a se sacudir e vai pra improvisada pista de dança. Um clone mais velho do Elymar Santos já dominava o ambiente, rodopiando com uma loira com cara de bem comportada.

O cliente reclamão volta, pega a bebida que pediu e fica secando a loira. Na verdade, a bunda da loira. Elymar Santos percebe e abre o botão de cima de sua própria camisa, assegurando que o macho adulto branco no comando era ele.

No meio disso tudo, entra um vendedor de flores, com as rosas mais feias e murchas que já vi.

- Quer comprar?
- Não, obrigado.


Diz isso e vai pro fundo do bar, uma região para onde apenas os iniciados vão. E some na muvuca.

A música muda novamente. Entra a versão original de "conheci um capeta em forma de guri", famosa no Brasil na voz do grande filósofo Sérgio Mallandro
, o mesmo de "vem fazer glu-glu".

Elymar Santos cover está infernal. Enquanto passa a mão na bunda da loira, acena para uma outra que está encostada na parede. Ele percebe que saquei seu movimento e faz um "high five", batendo na minha mão no alto. Não sei se elas notaram, mas ele parece não se importar nem um pouco.

Aparece um segundo vendedor de flores.

- Quer?
- Não... Ah, o seu companheiro está lá atrás.
- Merci.


E também some na fumaça de cigarro que empesteia o ambiente. Logo depois vejo dois buquês sacudindo no alto, no ritmo da música, com pétalas voando pra todo lado.

A loira sai, talvez para ir ao banheiro. O Elymar Santos francês não perde tempo e chega na outra. Logo abre um segundo botão. Em poucos segundos - em uma performance que mataria
Jece Valadão de inveja - conseguiu fazer a mocinha beijar seu peito pela camisa semi-aberta. A loira volta e, como se aquilo fosse muito normal, pede uma cerveja e fica observando a cena. O reclamão tenta se aproximar, mas ela não dá a menor bola. Aquele pedaço - já está claro - pertence ao outro sujeito.

Já era tarde, e depois de mais um chope resolvi ir embora. Os dois floristas saem também, totalmente embriagados. Na mão, umas hastes com as poucas pétalas sobreviventes.

- Quer comprar flores?

Eu olho pra o que restou delas e também para o que restou deles.

- Que flores?"



Do FRID:


Podia ou não acontecer em Pinheiros, Lapa, etc? Jece Valadão, cidadão do mundo!


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