À frente, o caminhão de lixo avança penosamente, enchendo de ruídos a noite de Ipanema. O sinal está aberto, mas ele pára justo na hora em que vou entrar na garagem.
Espero pacientemente, ouvindo a mistura de vidro quebrado, motor resfolegante, lixo remexido, gritos intensos e latas levantadas que toda madrugada interrompe o sono dos moradores. Felizmente, às 2h da manhã eu estou sempre acordado.
Um dos garis remexe o lixo da caçamba, cavoucando os objetos descartados diariamente pelos demais moradores da cidade. Em meio aos dejetos, puxa uma bandeira do Brasil. Admirado, ele abre o pedaço de pano, balança-o no ar, espana a poeira, livra-o das impurezas e limpa com a mão o resto de sujeira.
Em seguida, estende a bandeira e envolve suas costas com ela, como se fosse um manto. Volta a subir no caminhão e parte, com um largo sorriso no rosto.
Fiquei me perguntando quem teria se livrado da peça. Algum torcedor desgostoso com a Seleção Brasileira? Alguém desencantado com a participação do país nas Olimpíadas?
Seja lá o autor do gesto drástico, ele fez a alegria de um anônimo lixeiro, que vestiu com indisfarçável orgulho a bandeira e seguiu limpando as ruas do Rio abençoado pelo símbolo maior do país.
Mauro Ventura no "O Globo on Line" - http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/dizventura/
Atualização em 2014: crônica muito atual, depois do 7 x1 vergonhoso!
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