domingo, 25 de outubro de 2009

Drummond e o mar de Copacabana




A estátua



No mar estava escrita uma cidade.
Carlos Drummond de Andrade



Ser estátua
não é pedido que se faça.
E ele nem pediu.


No banco de pedra, de costas pro mar,
pensa a cidade.
Acolhe pombos e aves agourentas.

No meio-dia branco de luz,
o menino permanece sozinho.
O homem atrás dos óculos
quer a sombra de amendoeiras.
Tem oitenta por cento de ferro na alma.
Cem por cento de bronze na eternidade.

Alguns anos viveu no Rio de Janeiro,
serviu à cidade
que agora de nada lhe serve.


Ao povo sem memória,
a história mais bonita,
comprida história que não acaba mais.

Dívida


Drummond é Deus. Pai inalcançável.
Armando Freitas Filho

Eu não pensei em falar de Drummond.
Pelo menos neste poema, não quero.
Mas como evitá-lo? Como esquecê-lo
se a sua imagem é onipresente?



Lá está, sentado, de pernas cruzadas,
as costas pro mar de Copacabana.



O hábito de sofrer que o divertia,
era doce lembrança itabirana.
Já não sofre nem se diverte mais.
Agora estátua, apenas bronze frio,
o banco de pedra é quase um altar.

As crianças o tratam como santo.
Indecisos, adultos se dividem:
alguns adoram, vândalos aviltam.




No poema de Armando, Drummond é Deus.
Eu acredito. É Deus, está escrito.



AUGUSTO SÉRGIO BASTOS in "rascunho - o jornal de literatura do Brasil"

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