Rio 1 – Aqui, no Rio, 1952 começou sob o signo da melancolia: uma chuvinha aborrecida, quase uma garoa, enche os corações de tristezas vagas e estraga os banhos de mar. Copacabana está cinzenta e escura. Há pessoas supersticiosas que não gostam de um começo de ano assim: as coisas vão ficar pretas. Não, não creio nessas Cassandras de autolotação. Haverá, por todo este vasto Brasil, outras praias onde o sol não se escondeu, onde a sua luz e o seu calor alimentarão ainda a esperança dos homens e farão refulgir a beleza das mulheres. "A vida é bela e generosa", dirão esses seres felizes. Encaramujo-me em Copacabana e respondo sem muita convicção: amém!
Olho 1952 como um indivíduo que se vê no início de uma longa estrada desconhecida, que não se sabe onde vai dar, uma estrada que tanto pode ser de asfalto e ladeada de flores, quanto uma horrorosa picada cheia de curvas perigosas e buracos, uma estrada que pode não levar a lugar nenhum, acabando bruscamente num precipício vertiginoso e inevitável. Indivíduo da categoria humilde dos pedestres, ponho meu saco às costas e disponho-me a iniciar essa estranha caminhada no escuro. Sinto-me cansado e trôpego. Não conheço os lugares que percorrerei, não possuo uma carta topográfica dessas regiões ignoradas e talvez perigosas – e ninguém pode imaginar a falta que às vezes nos faz uma carta! (...)
(L.M)
Luís Martins in "O Estado de São Paulo, via "As Cartas de Tarsila do Amaral e Anna Maria Martins para Luís Martins", de Ana Luisa Martins.
Veja aqui o motivo da tristeza do autor.
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