terça-feira, 15 de março de 2011

Sendo criado sob o calvinismo holandês - Igreja Cristã Reformada - O Horror!!


O pai dos Schrader (Paul e Leonard, diretor e roteirista) era rigoroso até para os padrões estritos do calvinismo holandês. Ele obrigava a família - os garotos metidos em suas melhores roupas de domingo, camisas brancas engomadas, sufocantes, duras como tábuas - a chegar à igreja uma hora antes da missa para garantir que ele se sentasse no mesmo lugar, no mesmo banco. "Não importava o que você fizesse, ele sempre achava que era barulho demais e te dava uma cotovelada nas costelas", Leonard recorda. "A terceira cotovelada queria dizer que você seria chicoteado. Eu era chicoteado seis, sete dias por semana. Agir como um ser humano normal durante as 24 horas do dia, respirando, comendo, indo ao banheiro, vivendo uma vida normal, significava automaticamente quebrar pelo menos umas vinte regras a cada dia, e três delas mereceriam uma surra. Eu tirava minha camisa de domingo, meu pai me encostava na mesa da cozinha, pegava o fio de extensão do barbeador elétrico dele e batia em minhas costas com o plugue, o que deixava nelas uma bela estamparia de pingos redondos de sangue. Como se eu tivesse feito um teste de alergia no médico."


A mãe não era muito melhor. Numa tentativa de dramatizar o que era o inferno para o jovem Paul, ela enfiou uma agulha em sua mão. Quando ele gritou, ela disse: "Lembra o que você sentiu quando a agulha furou seu polegar? O inferno é assim, só que o tempo todo."


Mas ela tinha uma vantagem sobre papai. "O que salvava minha mãe era que ela era humana", Leonard continua. "Meu pai parecia uma máquina. Sempre me dizia quantas vezes ia me bater, dependendo da gravidade de minha ofensa. Se me dissesse que ia me bater vinte vezes, ele me batia vinte vezes. Minha mãe me batia com o cabo da vassoura. Na cozinha. Às vezes, ela quebrava o cabo nas minhas costas. Mas se a gente fazia minha mãe rir, ela não conseguia continuar. Eu guardava várias piadas para essas ocasiões, não piadas que eu achasse engraçadas - algumas eram as piadas mais idiotas que eu já ouvi -, mas as piadas que o grupo de amigas da minha mãe que se reunia no porão da igreja ia achar engraçado e que ela ainda não tinha ouvido. Eu esperava o primeiro golpe, aquele que jamais conseguia impedir. Aí eu contava a piada, fazendo força para me lembrar do final. Quando ela começava a rir, tudo estava OK, sempre com aquele fecho freudiano: "Não conte ao se pai, isso é segredo nosso', as surras sadomasoquistas no meio da cozinha."


"Como a geração sexo-drogas-e-rock'n'roll salvou Hollywood: Easy Riders, Raging Bulls", de Peter Biskind (Editora Intrínseca, 2009, tradução de Ana Maria Bahiana).

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