Terminal de ônibus tem veículos e passageiros. Muitos destes chegam de longe ou vão para lugares distantes, o que significa muitas horas no trânsito antes e/ou depois do trabalho, da escola. Horas que dão fome. Havendo necessidade, há sempre um empresário disposto a atendê-la, juntando a fome à vontade de comer.
No terminal de ônibus junto à estação Vila Mariana do Metrô não é diferente. Os passageiros são da região e de muito longe dali, como Pirituba, Lapa, Cidade Tiradentes, Vila Prudente, Cursino, etc. Haja fome! E empresários, formais e informais, para mitigá-la!
O terminal é composto por duas plataformas. Uma tem quatro microlanchonetes e a outra três. Apesar de pequenas, essas lojas têm de tudo: minipães de queijo, pães de queijo maiorzinhos, minibroas, coxinhas, rissoles, empadas, esfirras fechadas, cachorros-quentes, com uma ou duas salsichas compõem o cardápio local. Refrescos e refrigerantes para acompanhar, ou melhor, empurrar tudo garganta abaixo. Sobremesa? Uma fatia de bolo "caseiro", uma "anamaria". Pacotes de salgadinhos diversos decoram as lojinhas. Está bom ou quer algo mais sofisticado ou moderno? Pode ser um croissant ou um "Cup Noodles" esquentado na hora no micro-ondas. Mostarda e catchup? Basta bombear as embalagens plásticas com mais de um palmo e meio de altura.
Nada disso lhe apeteceu? Dê dois passos além do terminal e encontre nas calçadas em volta dele os vendedores de milho cozido, pamonha e curau, pastel e caldo de cana, e de frutas da época – banana sempre, abacaxi, mamão, melancia, caqui, figo, uvas, manga, etc. Só não tem vendedor de batatas fritas, como há no terminal do Metrô Belém. Um dia aparece.
Ainda está com fome? Quer algo mais substancioso? Só na hora do almoço. Logo ela aparece com seu carrinho de feira. Nele uma pilha de marmitas de alumínio dentro de caixas redondas de isopor branco-encardido. "Frango ou carne?", "café?", pergunta para os trabalhadores cotidianos do terminal: os fiscais dos ônibus, os motoristas e cobradores, os faxineiros, os seguranças, motoristas de táxi e os próprios empregados das tais lojinhas. Rapidamente a refeição e o dinheiro trocam de mãos. O trabalhador senta no banco de concreto, acomoda a marmitex, lança a tampa no cesto de lixo e degusta seu prato com os talheres plásticos. Pelo aroma, comida caseira bem temperada. Uma para mim, por favor.
Nessa hora, do outro lado da avenida, a lanchonete-restaurante está com as mesas cheias: pessoal dos escritórios da região e estudantes da faculdade vizinha. Mas estariam todos satisfeitos? Acho que não. A oferta é grand e e variada, mas sempre há gente que quer algo mais. Algo diferente, algo com amor. Certo. Mas no terminal de ônibus? Por que não? O amor move montanhas e trás a refeição certa para o ser amado.
Basta olhar na ponta da plataforma, no último banco de concreto. Um casal. Ela está sentada e tem uma caixa de plástico transparente no colo. Ele está em pé à sua frente e segura um par de hashis! Observo melhor: ela está com uma embalagem com sushis e sashimis! A tampa plástica é curva, acompanhando os rolinhos de sushi. Ao seu lado, um potinho com líquido escuro, talvez molho shoyu. Cena típica de Tóquio, Kyoto, Nagasaki, Fukushima e ... São Paulo!
Reparo que o casal não aparenta ter origens orientais, possui as características do típico paulistano ocidental: mistura de português, negro e índio, com toques de italiano, árabe e espanhol. É o caldeirão racial que torna nossa cidade tão cosmopolita. E que embola sushi com coxinha, pizza e esfirra. Cena tão encantadora: ele pega com cuidado e prática um sushi, molha no soyo e põe nos lábios dela. Ela sorri-lhe e mordisca o rolinho. Ele também sorri e coloca o restante na boca. Romântico, não?
Sim, se não fosse o ônibus saindo do terminal e espalhando fumaça de diesel. O casal não se incomoda. Agora é a vez dela. Pega um sashimi de salmão, molha e oferece ao parceiro. Ele reclina-se para mordê-lo, ela sorri e engole todo o peixe. Ele entra no jogo amoroso, dando e negando sushis e sashimis, e assim vão até acabar com o conteúdo da embalagem, entremeando com goles de cerveja em lata. Liberdade para os amantes!
Lábios limpos a guardanapo, beijinhos trocados, restos na lixeira e lá vai o casal pegar o ônibus para o terminal Pirituba. Viagem grande, mas tolerável com barriga cheia e boa companhia. Quem fica no terminal ainda escuta ela reclamar: cáía bem agora uma pipoquinha .... Ô povo insatisfeito!!
Epa: no terminal tem tudo, menos pipoqueiro!!
Chama o síndico! Tim Maia!
José FRID
9 comentários:
Frid
Parabéns por mais um belo texto sobre o cotidiano da metrópole paulistana.
Já está mais do que madura a impressão e publicação de uma coletânea com as melhores delas.
Depois dos elogios, com minha mania de revisor registro 2 canetadas, quais sejam:
Curau e não cural e
Shoyu e não soyo.
Abração do
Ayrtão
Fico contente que você tenha gostado. Pode canetar à vontade, pois só acrescenta ao texto. Já corrigi o "cural" para "curau" e o "soyo" para "shoyu"!
Continue lendo com pente fino!!
Grande abraço
FRID
Muito bom.
Margarida
Brigadão! Continue lendo!
rsrsrs!
Sushi com amor? Ai sim!
Sei bem como são os terminais e metro daí! Loucura loucura!
Mais eu prefiro bem mais essas comidas típicas de terminais do que moela de galo! kkkkkkkkkk
Fernanda
Com amor tudo fica melhor, até moela de galo!!
FRID
Frid, muito bom!!!! Você já tem mais uma assídua admiradora das crônicas “fridianas”.
Obrigada pela oportunidade!
Abraço,
Márcia
Sei que o mercado editorial brasileiro é um nó, mas já tentou publicar suas crônicas em livro? São muito boas.
Salete
São seus olhos...
FRID
Postar um comentário