quarta-feira, 9 de julho de 2014

Fim de ano


Nem o pormenor simbólico
de substituir um dois por três
nem essa metáfora baldia
que convoca um lapso que morre e outro que surge
nem o término de um processo astronômico
atordoam e minam
o páramo desta noite
e nos obrigam a aguardar
as doze irreparáveis badaladas.
A verdadeira causa
é a suspeita geral e difusa
do enigma do Tempo;
é o assombro diante do milagre
de que apesar de infinitos acasos,
de que apesar de sermos
as gotas do rio de Heráclito,
algo perdure em nós:
imóvel, 
algo que não encontrou o que buscava.



Jorge Luis Borges in "Fervor de Buenos Aires", 1923, Primeira Poesia, Companhia das Letras, 2008, tradução de Josely Vianna Baptista

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