Pode me chamar de senador", disse o senador. "Ou de ex-senador. Pode me chamar de ex-senador", disse o ex-senador. "Ocupei o cargo entre 1912 e 1916 e fui eleito pela lei Sáez Pena e naquele tempo o cargo era quase vitalício, de maneira que na realidade teria de me chamar de senador", disse o senador. "Mas considerando-se a situação atual talvez seja preferível, e não apenas preferível como inclusive mais conforme com a verdade dos fatos e com o sentido geral da história argentina, que o senhor me chame de ex-senador", disse o ex-senador. "Porque, falando com propriedade, que é um senador senão alguém que legisla e faz discursos? Mas e quando não legisla? Quando não legisla converte-se automaticamente num ex-senador. Muito bem, mas no caso de a pessoa manter do cargo, ou melhor, da função, a particularidade de fazer discursos, mesmo que ninguém a escute e ninguém a contradiga, então, em certo sentido, a pessoa continua sendo um senador. Portanto prefiro que o senhor me chame de senador", disse o senador.
Ricardo Piglia in Respiração artificial, Companhia das Letras, 2010, pág.36
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