terça-feira, 14 de abril de 2015

Traduzir-se


Uma parte de mim:
é todo mundo
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera: 
outra parte delira.
                                              
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
                                         
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.


Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?


Ferreira Gullar

2 comentários:

Beth Foglia disse...

Nossa, sempre procurei esse poema!!
Mas, como uma parte de mim está sempre ocupada, e a outra, tem sempre algo a fazer, nunca procurei.
Valeu, Zé Frid

Metamorfose Ambulante disse...

Sempre às ordens!