sábado, 26 de março de 2016

Segunda luminosa


Segunda, um  belo e luminoso dia. Subo a rua a caminho do Metrô, o áureo sol colore os edifícios, reflete-se nas vitrines, nos vidros dos carros, dá ânimo aos pedestres, luz, muita luz, só o asfalto fica-lhe indiferente. O céu de brigadeiro acalma, promete surpresas agradáveis, nenhuma nuvem escura na vida das pessoas, que me parecem, todas, animadas, esperançosas, coloridas. Será que não é segunda-feira? Esqueço um pouco os seres de luz e caminho concentrado na minha reunião dali a pouco, para não receber um bilhete azul...

Passo pela última banca de jornal e quase tropeço em duas bolsas e uma mochila escuras, que jazem bem no meio da calçada. Procuro em volta o sem-teto ou o ambulante proprietário daquelas coisas. Ninguém. Dou três passos e quase esbarro com uma mulher que chora. Caminha desnorteada e chora.

Choro sentido, contido, doído. Apesar das cores luminosas do sol e do céu, tudo está sombrio com ela naquela manhã de segunda-feira: cabelos pretos, olhos escuros, maquiagem escura, blusa de manga comprida preta, calças pretas, botas pretas. E malas e bolsas e sacolas e pacotes. Escuros.

Ela chora, soluça, caminha. Pega os três volumes e retorna, chorando, soluçando e falando baixinho, a maquiagem borrada, os cabelos agora em desalinho. Empilha as bolsas e a mochila em cima de outras, contidas por um pequeno carrinho de supermercado, cujas barras metálicas refletem o esplendor do sol. Os reflexos tentam pôr cor na vida daquela mulher, mas seus trajes escuros qual uma mortalha tudo absorvem.

De pé, apoiada na sua bagagem, mudança, alheia aos luminosos pedestres, ela chora, soluça, resmunga para si mesmo. Seu olhar perdido num horizonte distante e sombrio, pouco acima do negrume do asfalto, os olhos negros não conseguem captar o azul do céu, não encontram saída para ela naquela segunda-feira...


José FRID

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