quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Manha de sol - Ferreira Gullar

 
Vianinha, Paulinho, Armando Costas
               que dia lindo, não?
Estou passando de carro
ao lado do cemitério São João Batista
e quase escuto vocês aí dentro
                   falando e rindo
                   debaixo deste sol.

Deve ser bom estar assim entre amigos
                 livres das aporrinhações da vida
a olhar as nuvens
                  e os passarinhos
                  que por aí
                   passarinham.

Invisíveis,
                 de que falam vocês
recostados no túmulo de Vinícius de Moraes?
DO CPC? do Opinião? do futuro
da Nova República?
                 ou simplesmente flutuam
                  como os ramos
                  ao fluxo da brisa?

Paro no sinal da Rua Mena Barrreto.
- E pode um marxista admitir
   conversa entre defuntos?
   Não é a morte o fim de tudo?
- É claro, digo a mim mesmo, é claro –
                 e sigo em frente.

Mas dentro da minha alegria
os três amigos continuam a conversar e rir
nesta manhã brasileira
                        que torna implausível a escura morte.


Ferreira Gullar in Barulhos, José Olympio Editora, 7ª edição, 2013, págs.82/83


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