quinta-feira, 16 de março de 2017

Ano-novo - Ferreira Gullar


Meia-noite. Fim
de um ano, início
de outro. Olho o céu:
nenhum indício.

Olho o céu:
o abismo vence o
olhar. O mesmo
espantoso silêncio

da Via Láctea feito
um ectoplasma
sobre a minha cabeça:
nada ali indica
que um ano novo começa.

E não começa
nem no céu nem no chão
do planeta:
começa no coração.

Começa como a esperança
de vida melhor
que entre os astros
não se escuta
nem se vê
nem pode haver:
que isso é coisa de homem
esse bicho
                  estelar
                  que sonha
                  (e luta).


Ferreira Gullar in Barulhos, José Olympio Editora, 7ª edição, 2013, págs.55/56

Nenhum comentário: