Companhias como a GM ou a Ford, que chegaram a uma situação de quase falência depois de muitos anos de má conduta, merecem mesmo ajuda do governo?
Por J.R. Guzzo ( Revista EXAME )
Eis aí um bom momento, certamente um dos melhores que já apareceram nestes últimos anos, para debater uma questão que nunca vai realmente embora: o Estado deve ou não botar a mão no bolso para salvar uma empresa privada, ou algumas, que está no centro da economia nacional? "Salvar" não é, talvez, a melhor expressão; mais correto seria dizer "tentar salvar", pois numa epopéia dessas, como de costume, sabe-se em primeiro lugar e com certeza quanto dinheiro o Erário gastará, mas só bem depois vai se verificar se isso de fato serviu para manter as empresas vivas ou se não adiantou nada. As empresas envolvidas são a General Motors e, logo depois dela (ou junto), a Ford e a Chrysler, peças fundamentais no funcionamento de toda a engrenagem industrial dos Estados Unidos. A GM, como se sabe, está em situação de pré-falência. Tem despesas de 11 bilhões de dólares por mês para funcionar no seu dia-a-dia, mas dispõe de menos de 16 bilhões em caixa; pode ficar sem dinheiro para pagar suas contas já neste próximo mês de janeiro. A Ford e a Chrysler se dizem em situação menos letal, mas não muito; e, em todo caso, se a GM rodar, elas rodam junto. Todas as três garantem que precisam do dinheiro do governo com o máximo de urgência.
A perspectiva de falência múltipla de órgãos na indústria automobilística americana é a mais potente das bombas de efeito retardado - e nem tão retardado assim - que a escassez de crédito causada pela crise nos mercados financeiros deixa para estourar no meio da chamada economia real. Para as montadoras, que até o final da semana passada continuavam lutando corpo a corpo em busca de apoio no Congresso americano, não haverá salvação sem dinheiro público; para o governo e os congressistas, a questão toda é um grande divisor. Os adeptos da ajuda argumentam com o efeito radioativo que uma falência da GM, ou, pior que isso, uma falência tripla, teria no conjunto da economia americana e mundial. Aos 100 anos de idade, 77 dos quais como a maior empresa automobilística do mundo em vendas, a GM emprega mais de 260 000 pessoas só nos Estados Unidos, tem fábricas em 35 países e produziu mais de 9 milhões de veículos em 2007. Junto com a Ford e a Chrysler, está no coração da indústria americana: se caírem, as três arrastarão consigo uma quantidade desconhecida de empresas, nos Estados Unidos e pelo mundo afora. Na soma total de suas atividades, a indústria automotiva americana responde por 3 milhões de empregos dentro dos Estados Unidos - e cortes maciços nesse mar de gente podem ter conseqüências sombrias no agravamento da recessão que já existe. "Deixar que o setor quebre é maravilhoso nos manuais de economia", diz o diretor de uma firma americana de investimentos, "mas pode ser um desastre no mundo real." Os adversários do socorro às montadoras não discutem a dimensão dos números nem os riscos da viagem a território não mapeado que seria deixá-las quebrar. Mas acham que a indústria automobilística americana precisa de uma "recriação" - e não de um cheque.
Se houver uma ajuda do governo, argumentam os defensores dessa idéia, as três empresas e a cadeia de produção a seu redor jamais farão por si próprias as mudanças indispensáveis para a sua sobrevivência; dar dinheiro público a elas, na verdade, seria como garantir a sua morte. Não é nenhum segredo, de fato, que a situação ruinosa das montadoras foi construída muito antes de aparecer a crise financeira. A seca geral no crédito criou o quadro desesperado de hoje, claro, mas a calamidade já estava pronta. Há quatro anos, a GM não tem um tostão de lucro; suas ações, ao longo dos últimos 12 meses, perderam 90% do valor; a empresa paga cada vez mais salários em troca de cada vez menos trabalho, até porque grande parte da folha se destina a remunerar seus 480 000 aposentados. Somadas, as montadoras americanas ficam com menos de 50% das vendas de veículos no mercado interno. Seus carros consomem cada vez mais gasolina e ficam cada vez mais distantes dos competidores em termos de inovação - esforço que, segundo imaginam, é o governo que teria de custear. Seus executivos, há anos, concentram-se mais em atuar junto à bancada automobilística e aos lobbies de Washington do que no trabalho de construir carros. Um deles, o vice-presidente da GM, Bob Lutz, chegou a dizer que modelos flex "não fazem sentido econômico".
É do interesse público que a indústria automotiva americana continue a existir, sem dúvida. Mas com os hábitos, os modelos de gestão e os executivos que tem hoje parece difícil chegar lá.
Um comentário:
Que venham os japoneses pois os americanos nos fizeram engolir porcarias até hoje,aliás,nunca deram importancia para o Brasil e agora vem
dizer que o Brasil é muito importante para eles e mesmo assim continuam construindo porcarias de carros(compare Vectra com Civic ou Corolla e veja a diferença).Comprem outras marcas pois estas merecem nosso desprezo. Abraços:Cristiano.
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