Ele sai do restaurante a quilo com sua bandeja. Parcialmente calvo, cabelos curtos ainda grisalhos, cãs totalmente brancas. Veste uma malha com largas listas horizontais em marrom escuro, marrom claro e bege, que combina com uma calça marrom escura e sapatos de amarrar na mesma cor, bem engraxados. Anda com dificuldade, segurando a bandeja com o prato. Apesar dos seus prováveis quase oitenta anos, o que lhe atrapalha não é a idade ou o peso da refeição, mas um saco plástico de supermercado que ele leva em uma das mãos, que oscila a cada passo que ele dá. Pela transparência do plástico percebe-se que é um objeto escuro, cilíndrico e comprido. Pode ser um guarda-chuva, pois ameaça chover.
Ele, enfim, consegue alcançar uma mesa desocupada. Depõe sobre ela a bandeja e pendura, com muito cuidado, o saco na cadeira ao seu lado. Senta-se e com gestos calmos afasta de si a bandeja, retira o prato e coloca-o à sua frente. A comida é pouca. Dieta? Dá para ver no prato uns salgadinhos e um pequeno pedaço de linguiça calabreza, o que quebra qualquer regime. Retira os talheres do saquinho plástico e coloca-os no prato. Pega o copo de plástico, que parece estar vazio, e arruma-o ao lado do prato. Tudo pronto para a refeição? Not yet!
Segura o saco plástico e com cuidado retira seu conteúdo: uma garrafa de vinho tinto!! Ela está cheia até pouco mais da metade. Ele a desarrolha e o espocar chama a atenção dos vizinhos da área de alimentação do shopping. Ele ignora-os. Despeja um pouco de vinho no copo, coloca a rolha no lugar, devolve a garrafa ao saco e este à cadeira. Agora sim está pronto para almoçar.
Todos ao seu redor ficam surpresos com a garrafa de vinho. Será um alcoólatra? Tomam um gole de seus copos de refrigerantes, cervejas e até milk-shake, e passam a observar o depravado. Alguns comentam entre si que a dificuldade de caminhar dele deve ser devida ao álcool já ingerido. Tadinho! Tão cedo!!
Sem perceber ser o centro das atenções, ele, depois de algumas garfadas, mastigadas pausadamente, limpa os lábios no guardanapo de papel e toma um gole de vinho. Repete a operação várias vezes até terminar, de forma sincronizada, com os alimentos e o vinho. Pega o saco com o vinho e sai serelepe pelo shopping, dando algumas olhadelas para as senhoras mais enxutas.
Cai a ficha do povo: o homem cuida do coração!! Uma taça de vinho tinto às refeições é a recomendação de todo cardiologista. Eles olham para suas bebidas: prometem-se cuidar melhor da saúde na próxima refeição. MacDonald? Habib's?
2 comentários:
Fast-food é o cace... o negócio é um fast-wine!
Uma vez eu vi no Amaury Júnior uma máquina (“dispenser”) de vinhos de boa qualidade. A pessoa selecionava o tipo que desejava provar, inseria a quantidade de moedas de acordo com o valor cobrado e, depois, a máquina despejava cuidadosamente uma dose do vinho na taça. Fantástico!
Temos que correr atrás dessas máquinas e colocá-las nas praças de alimentação dos melhores shoppings de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Abraços,
H.
Eu vi essa reportagem também! Passou há muito tempo, não? Vou correr atrás do fabricante! Pode ser uma boa ideia.
Bom jogo amanhã!
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