quinta-feira, 28 de abril de 2011

Laurete ou Homem não presta!! (E mulher?)


 
Teatro Paulo Autran, Sesc Pinheiros. Show do maestro, compositor e arranjador Arthur Verocai. Palco lotado de artistas: um conjunto de metais com cerca de dez músicos, um grupo de cordas com uns quinze instrumentistas, o baterista e sua cozinha, dois percursionistas e seus muitos apetrechos, dois pianistas, duas cantoras, um cantor e o maestro. Por sinal, uma simpatia de maestro. Alto, magro, elegantemente deselegante. Antes de cada música ele fala, meio constrangido, um curto texto sobre ela ou fato da época de sua elaboração. Ele mesmo diz que é melhor regendo, arranjando, compondo, do que falando.

Assim, vamos à musica. Executadas algumas partituras, ele convoca a cantora Célia para uma participação especial. Explica que o disco que está sendo reproduzido no show só foi gravado, nos idos de 1972, devido à influência dela junto à gravadora. Ela entra no palco sob muitos aplausos. Traja calça comprida e blusa larga, ambas pretas com detalhes brilhantes. A voz continua a mesma e encanta a plateia. A música é daquela época e adequada ao poder vocal da cantora, ainda íntegro. Ela se despede sob ovação carinhosa da plateia. 

Algumas músicas depois, Verocai chama ao palco o cantor Marcelo Janeci, para quem acabou de arranjar as canções do seu novo CD. Burburinhos nos bastidores e o maestro informa que o músico será acompanhado pela cantora Laura Lavieri.  

O jovem casal entra no palco. Ele é bem mais alto do que ela e está trajado de forma simples, calça e camisa discretas. Ela, muito nova, loiríssima, porta um sumaríssimo colante e decotado vestido, e calça sandálias altíssimas, que destacam a tatuagem da batata da perna direita, com mais de um palmo de altura. 

O contraste é flagrante: as outras cantoras são mulheres grandes e mais velhas,  que estão de roupa escura, calças e blusas fechadas. Uma violinista está de vestido longo, outra de calça comprida e blusa discreta. Afinal, trata-se de um concerto, o foco é na música e não no instrumentista.

A plateia masculina não resiste àquela inesperada figura sensual e muitos assovios são arremessados à cantora. Ela fica totalmente sem graça com a reação dos espectadores, mas não pode desistir: o maestro a espera no centro do palco. Caminha ao lado do Marcelo, constrangida, medindo os passos para evitar que o vestido suba ainda mais. Consegue chegar até o Arthur sem mostrar mais carnes. Ela e o maestro se cumprimentam com beijinhos, o que obriga a ele reclinar-se em sua direção e a ela elevar seu corpo, o que faz o vestido deslizar... para cima. Mais apupos fogosos da plateia. 

Homens não prestam, diriam as feministas diante da cena. Eles deveriam respeitar a opção da cantora na escolha do vestuário, segundo elas. (Quem não presta, afinal: o homem, que sucumbe inocentemente aos encantos do corpo feminino, ou a mulher, que explora  com seus dotes físicos a fraqueza masculina, usa roupas provocantes e tira partido do seu corpo? Cartas para a redação.)

Laura percebe na hora que seu vestido é revelador e provocante, inadequado para aquele show. Será que ela foi pega de surpresa com o convite do maestro ou pensou que, se a Paula Fernandes exibiu as pernas para o Roberto, com tanto sucesso, por que ela não pode exibir seus dons, explorar o desejo masculino?  

O maestro rege a orquestra. Laura canta em duo com o Marcelo, e canta bem, voz bonita, limpa e suave. Ela segura o microfone com uma mão e o vestido com a outra, sob o olhar intimidador da plateia masculina. Eles concluem a música e recebem aplausos. Ela, empolgada, esquece do seu traje e reclina-se para agradecer e com isso o vestido sobe e os aplausos viram muitos assobios entusiasmados. Como o Marcelo vai continuar no palco, irá tocar acordeão, Laura se despede do maestro e agora tem que atravessar sozinha o palco para sair de cena. Lá vai ela no seu passinho mambembe sob apupos entusiasmados da alcateia masculina.

O show continua e é a vez do Danilo Caymmi entrar em cena, antigo parceiro do maestro. Ele canta e encanta, sua flauta dialoga com o acordeão  do Marcelo e com a massa sonora da orquestra. Agora é hora da música final, antes do inevitável bis. O maestro convoca a Célia, que entra sob aplausos e se coloca junto aos três cantores. Tudo pronto, o percursionista interrompe o maestro dizendo que está faltando a "Laurete" no palco. Verocai, questiona que "Laurete" é essa. O músico explica, excitado, que é aquela cantora que entrou com o Marcelo. O maestro, pego de surpresa, consulta os bastidores. Autorizado, convoca a cantora para o palco.

Repete-se a cena inicial, agora sem o apoio do Marcelo: ela medindo os passos para o vestido não subir e a plateia masculina saudando-a com muitos assovios. Um mais animado chama-a de "gostosa". Outro de "tesão". Parecia que ela estava passando na porta de obra na hora do almoço dos peões. Como ela não era esperada, encaixam-na entre a Célia e a Clarisse, uma das cantoras. De longe, parece o  "Robim" entre dois "Batmans".

A música final é iniciada sob a batuta do maestro, todos tocam seus instrumentos e todos cantam, menos a "Laurete", que não tem microfone, não alcança os das duas colegas e nem sabe a letra, ou seja, fica com cara de paisagem a segurar a barra do seu vestido. A música tem frases melódicas que se repetem, soladas por cada instrumentista. Clarisse fica com dó da Laura, acomoda-a próximo à estante de partituras e franqueia-lhe o microfone. Vemos Laura cantar, mas não a escutamos diante das vozes poderosas do Danilo Caymmi, da Célia, da Clarisse Grova, do Carlos Dafé e da Jurema de Candia.

A música termina, o maestro agradece a ovação da plateia. Os instrumentistas e cantores agradecem também, "Laurete" sempre preocupada com a barra do vestido. Verocai sai do palco, a platéia faz sua parte e convoca-o para o bis com palmas ritmadas. Concluído o show, os artistas vão saindo do palco e "Laurete" segue sua sina, atravessando o palco sob assovios incansáveis da porção masculina da plateia. Será que esse povo nunca viu mulher de pernas de fora?


Eu? Muito bem comportado. (Apenas assovios mentais solidários, afinal minha Laura estava ao meu lado!)


José FRID

10 comentários:

Anônimo disse...

Muito boa!



Abço!

Luis

Anônimo disse...

tudo tem a sua hora.......

Ervin

Anônimo disse...

Era só o que faltava você com uma Laura do seu lado, olhando e assoviando para outra Laura!

Fernanda

GuessWho disse...

ahahahah :) pois que gostei.

Anônimo disse...

Garoto!
Ficaste quietinho para não levar a pior em casa, tu é muito esperto, é isso aí.
A mulherada esta apelando muito.
Bom final de semana, com muita moderação, ha,ha,ha,ha.
Aquele abraço.


M.

Anônimo disse...

Muito boa essa sua dica cultural...

Abs

Paulo T.

Anônimo disse...

lindoooooooo!

M.D

Anônimo disse...

Legal.

Grande abraço,
Pedro M

Anônimo disse...

OLá!

Qto à sua indagação, creio que os dois lados.
Sabe q, enqto lia, estva vendo o momento q revelaria o "algo mais" da "Laurete":
que na verdade tão só um vigoroso "Lauro" ou quiçá outro nome. Mas não. O final foi o mais obvio possível. Mas q seria engraçado, ah isto seria!

Bem então é isto.

Aquele abraço...

Zora

Metamorfose Ambulante disse...

Numa outra crônica minha você também esperava uma virada de sexo, lembra?
Reescrevi com o final sugerido por você.

Vou tentar fazer igual.

Grande abraço!

Frid