sexta-feira, 20 de abril de 2012

O Camelô e o Executivo




Chuvas de verão no outono. Águas de Março em Abril. Quatro horas da tarde, noite em São Paulo. As grossas nuvens negras desabam sobre a cidade. Pingos mais grossos que polegares, ventos típicos de turbina de avião a jato, águas escorrendo  como um Amazonas, raios e relâmpagos do fim do mundo. (ou do Big Bang!)

O executivo, imerso em seus problemas e decisões, contabilizando o lucro da venda feita, só percebe o dilúvio ao chegar na portaria do edifício. Olha a cortina d'água, pensa no seu próximo compromisso e vê a hora no celular. Calcula o trajeto e constata que tem dez minutos de folga. Prazo para São Pedro se divertir, lavar as ruas e partir com suas nuvens para outra freguesia, estipula o executivo.

Distrai-se com o malabarismo dos pedestres evitando as poças d'água, as correntezas. Sorri quando o vento entorta um guarda-chuva, levanta uma saia, despenteia um cabelo. Ri ao ver um carro passar e encharcar os passantes. Lembra-se de uma chuvarada na praia... atende o celular, confirma a reunião.

Confere a hora, olha o céu, impreca a São Pedro, procura uma solução. Time is money. Corre até a marquise mais próxima e verifica o prejuízo. Cabelos escorridos, terno úmido, relógio respingado, sapatos molhados. Solução?

- Casarão é dez. Casarão é dez. Casarão é dez. Mais barato que Benegripe.

O executivo examina a mercadoria apregoada pelo camelô. Olha o céu, sem previsão de estiagem. Boa relação benefício-custo. Escolhe entre a meia dúzia de guarda-chuvas um estampado com xadrez discreto para combinar com o terno. Testa. Paga com uma nota de cem reais, novinha, uma belezura. 

- Tem menor, dotô? Tô começando agora...
- Só tenho essa, umas moedas e cartões. Ninguém usa mais dinheiro.
- Cartão, não, dotô, não tenho maquininha.
- Como fazemos? Tenho que ir!
- Segura pra mim esses aqui que vou procurar troco na carteira.

O executivo segura com a mão esquerda o maço de guarda-chuvas fechados e na direita porta o guarda-chuva aberto, aquele xadrez que combina com o terno. O camelô cheira a nota azul novinha, beija-a antes de colocá-la no bolso da camisa e ... sai correndo desembestado pela rua como um Usain Bolt tupiniquim, indiferente à chuva, ao vento, às poças, raios e relâmpagos, agradecendo a São Pedro pela chuva de cada dia. Duro é ganhar dinheiro no inverno.


- Quanto é o guarda-chuva, meu senhor?
- Cem, é cem reais, porra!!!!


José FRID

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4 comentários:

Anônimo disse...

Bom dia Frid!

Executivos e funcionários que passam o dia trancafiados em salas sem janelas onde o sol é substituído por lâmpadas fluorecentes e janelas por paredes, só percebem a chuva ao sair do edifício. Preço do guarda-chuva no metrô São Bento na hora da chuva: 10 Reais. Preço do guarda-chuva na estação Paraíso: 15 Reais. A chuva é a mesma, mas a cada etação de metrô inflaciona o valor do guarda-huva. Dinheiro duro de ganhar. Dicheiro fácil de gastar. Votos de um excelente final de semana. Com muito sol, assim espero!

Fátima

Anônimo disse...

Valeu meu amigo.
ABS;
Joaquim

Anônimo disse...

Adorei

Margarida

Anônimo disse...

Meu amigo

No momento só tive a oportunidade de ler esta crônica chuvosa e, como sempre vc pode ficar encabulado novamente.

Abs

Márcia